Os fatos que o
Evangelho relata e que foram até hoje considerados milagrosos pertencem, na sua
maioria, à ordem dos fenômenos psíquicos, isto é, dos que têm como causa
primária as faculdades e os atributos da alma.
Confrontando-os
com os que ficaram descritos e explicados no capítulo precedente,
reconhecer-se-á sem dificuldade que há entre eles identidade de causa e de
efeito. A História registra outros análogos, em todos os tempos e no seio de
todos os povos, pela razão de que, desde que há almas encarnadas e desencarnadas,
os mesmos efeitos forçosamente se produziram. Pode-se, é certo, contestar, no
que concerne a este ponto, a veracidade da História; mas, hoje, eles se
produzem às nossas vistas e, por assim dizer, à vontade e por indivíduos que
nada têm de excepcionais. O só fato da reprodução de um fenômeno, em condições
idênticas, basta para provar que ele é possível e se acha submetido a uma lei,
não sendo, portanto, miraculoso.
O princípio dos
fenômenos psíquicos repousa, como já vimos, nas propriedades do fluido
perispiritual, que constituí o agente magnético; nas manifestações da vida
espiritual durante a vida corpórea e depois da morte; e, finalmente, no estado
constitutivo dos Espíritos e no papel que eles desempenham como força ativa da
Natureza. Conhecidos estes elementos e comprovados os seus efeitos, tem-se,
como conseqüência, de admitir a possibilidade de certos fatos que eram
rejeitados enquanto se lhes atribuía uma origem sobrenatural.
Sem nada prejulgar quanto à natureza do
Cristo, natureza cujo exame não entra no quadro desta obra, considerando-o
apenas um Espírito superior, não podemos deixar de reconhecê-lo um dos de ordem
mais elevada e colocado, por suas virtudes, muitíssimo acima da humanidade
terrestre. Pelos imensos resultados que produziu, a sua encarnação neste mundo
forçosamente há de ter sido uma dessas missões que a Divindade somente a seus mensageiros
diretos confia, para cumprimento de seus desígnios. Mesmo sem supor que ele
fosse o próprio Deus, mas unicamente um enviado de Deus para transmitir sua
palavra aos homens, seria mais do que um profeta, porquanto seria um Messias
divino.
Como homem,
tinha a organização dos seres carnais; porém, como Espírito puro, desprendido
da matéria, havia de viver mais da vida espiritual, do que da vida corporal, de
cujas fraquezas não era passível. A sua superioridade com relação aos homens
não derivava das qualidades particulares do seu corpo, mas das do seu Espírito,
que dominava de modo absoluto a matéria e da do seu perispírito, tirado da
parte mais quintessenciada dos fluidos terrestres (cap. XIV, nº 9). Sua alma,
provavelmente, não se achava presa ao corpo, senão pelos laços estritamente
indispensáveis. Constantemente desprendida, ela decerto lhe dava dupla vista,
não só permanente, como de excepcional penetração e superior de muito à que de
ordinário possuem os homens comuns. O mesmo havia de dar-se, nele, com relação
a todos os fenômenos que dependem dos fluidos perispirituais ou psíquicos. A
qualidade desses fluidos lhe conferia imensa forca magnética, secundada pelo
incessante desejo de fazer o bem.
Agiria como
médium nas curas que operava? Poder-se-á considerá-lo poderoso médium curador?
Não, porquanto o médium é um intermediário, um instrumento de que se servem os
Espíritos desencarnados e o Cristo não precisava de assistência, pois que era
ele quem assistia os outros. Agia por si mesmo, em virtude do seu poder
pessoal, como o podem fazer, em certos casos, os encarnados, na medida de suas
forças. Que Espírito, ao demais, ousaria insuflar-lhe seus próprios pensamentos
e encarregá-lo de os transmitir?
Se algum influxo
estranho recebia, esse só de Deus lhe poderia vir. Segundo definição dada por
um Espírito, ele era médium de Deus.
(Do livro "A Gênese",cap. 15, Kardec, FEB)
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