Em nossas faltas, na maioria das vezes, somos imediatamente
perdoados, mas não limpos.
Fomos perdoados pelo fel da maledicência, mas a sombra que
tencionávamos esparzir, na estrada alheia, permanece dentro de nós por agoniado
constrangimento.
Fomos perdoados pela brasa da calúnia, mas o fogo que
arremessamos à cabeça do próximo passa a incendiar-nos o coração.
Fomos perdoados pelo corte da ofensa, mas a pedra atirada
aos irmãos do caminho volta incontinenti, a lanhar-nos o próprio ser.
Fomos perdoados pela falha de vigilância, mas o prejuízo em
nossos vizinhos cobre-nos de vergonha.
Fomos perdoados pela manifestação de fraqueza, mas o
desastre que provocamos é dor moral que nos segue os dias.
Fomos perdoados por todos aqueles a quem ferimos, no
delírio da violência, mas, onde estivermos, é preciso extinguir os monstros do
remorso que os nossos pensamentos articulam, desarvorados.
Chaga que abrimos na alma de alguém pode ser luz e renovação
nesse mesmo alguém, mas será sempre chaga de aflição a pesar-nos na vida.
Injúria aos semelhantes é azorrague mental que nos chicoteia.
A serpente carrega consigo o veneno que veicula.
O escorpião carrega em si próprio a carga venenosa que ele
mesmo segrega.
Ridiculizados, atacados, perseguidos ou dilacerados,
evitemos o mal, mesmo quando o mal assuma a feição de defesa, porque todo mal
que fizermos aos outros é mal a nós mesmos.
Quase sempre aqueles que passaram pelos golpes de nossa
irreflexão já nos perdoaram incondicionalmente, fulgindo nos planos superiores;
no entanto, pela lei de correspondência, ruminamos, por tempo indeterminado, os
quadros sinistros que nós mesmos criamos.
Cada consciência vive e evolve entre os seus próprios reflexos.
É por isso que Allan Kardec afirmou, convincente, que,
depois da morte, até que se redima no campo individual, “para o criminoso a
presença incessante das vítimas e das circunstâncias do crime é suplício
cruel”.
(Do livro "Justiça Divina", Emmanuel, psicografia de Chico Xavier, FEB)